Por: Julyana Araújo
Não há barreiras ou condição genética para o amor, a vontade de aprender, trabalhar e se divertir. A única limitação é o preconceito. Com o incentivo ao desenvolvimento, tudo se torna possível. No último domingo, 21 de março, comemorou-se o Dia Internacional da Síndrome de Down, que ao contrário do que alguns pensam, não é uma doença, e sim uma mutação do material genético humano. A data, que faz referência aos três cromossomos no par 21, tem o objetivo de conscientizar a população sobre a inclusão das pessoas com Down e a importância da luta por direitos iguais. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 300 mil brasileiros são acometidos pela síndrome no país.
Não é doença
A falta de informação e o preconceito com as diferenças geram más interpretações acerca do tema. É importante ressaltar que síndrome é um termo que designa um conjunto de sinais e sintomas, portanto não significa doença. Sendo assim, de acordo com as informações do Portal Drauzio Varella, a Síndrome de Down, ou Trissomia do cromossomo 21, é uma condição genética no qual a criança, em vez de ter dois cromossomos no par 21, possuem três. Todavia, não se sabe por que isso acontece. As pessoas com SD apresentam características como olhos amendoados, rosto arredondado, mãos menores etc. Depois do nascimento, o diagnóstico clínico de Síndrome de Down é comprovado pelo exame do cariótipo (estudo dos cromossomos).
“Todas as crianças nascem com um propósito”
Em entrevista concedida, Bruna Silva, mãe de Marina, relata que a gravidez foi muito tranquila: “Quando Marina nasceu, de imediato, as médicas me falaram sobre a Síndrome de Down. Durante a gestação, em nenhuma ultrassom ou exame, apareceu algum diagnóstico. Somente após o nascimento, eu fiquei sabendo da SD.” Bruna comenta que sua profissão, como professora, ajudou na questão do desenvolvimento intelectual e cognitivo na hora de colocar as atividades estimulantes em prática: “Sou formada em Geografia e, na faculdade, tinha uma disciplina chamada Educação Inclusiva. Eu gostei muito, inclusive, foi uma das melhores disciplinas, me aprofundei muito nesse assunto”, conta.
“Desde que descobri a SD de Marina, eu já tinha interesse na área. Já trabalhei em escolas com alguns alunos autistas e eu sempre buscava atividades para desenvolvê-los; com Marina, não foi diferente. Passei a pesquisar cada vez mais. Sempre que ia para uma terapia, perguntava às fisioterapeutas dela, elas me ajudavam muito. Peguei as informações das terapeutas, da fono e da fisio, juntamente com as informações da internet, e até hoje, eu pesquiso muito. O que eu puder fazer para ajudar no desenvolvimento dela, eu continuarei fazendo”, afirmou a professora.
Bruna declara que Marina seria sua filha independente de qualquer coisa: “Não tive nenhum preconceito, medo, choque, muito pelo contrário. O que me deixou preocupada era que eu não tinha conhecimento do fato, de aproximadamente 75%, das crianças com Síndrome de Down nascerem com cardiopatia. Isso foi o que mais me deixou apreensiva nos primeiros dias de vida dela. Ela teve que passar por uma bateria de exames para ver como estava o coração, mas, graças a Deus, estava tudo bem. Ela não nasceu com nenhuma cardiopatia”, ressaltou.
Apesar dos desafios enfrentados pelas pessoas com SD, a mãe de Marina conta que sempre houve muito amor: “A gente sabe que, infelizmente, existe muito preconceito, mas, graças a Deus, até hoje, Marina não sofreu nenhum preconceito, muito pelo contrário, aonde ela chega é muito amada. A família é louca por essa criança, todo mundo é louco por ela. Nunca teve ninguém que mostrou ato de preconceito contra ela”, pontua.
A mãe declara que a chegada de Marina mudou tudo de uma forma perfeita, que só Deus explica: “Eu acredito que todas as crianças nascem com um propósito, seja na vida dos pais seja na vida dos avós, elas vêm para nos ensinar. Para nos mostrar o mundo por outra perspectiva, outra visão. Porque a partir do momento que se tem um serzinho que depende de nós, você passa a olhar o mundo de outra forma. E o fato de Marina nascer com SD fez abrir um leque de informações, de conhecimentos e, principalmente, uma visão mais ampla da vida. A gente cresceu muito como ser humano e, hoje em dia, aprendemos a valorizar muito as nossas vidas”, afirmou.
Foto: Rubea França
Rede de apoio
Com apenas dois anos de idade, Marina já ultrapassa mais de 4 mil seguidores na rede social. Sua mãe, Bruna, conta que o intuito sempre foi ser uma rede de apoio: “A partir do momento que eu postei sobre a Síndrome de Down de Marina, no meu Instagram, muitas mães que também tem filhos Down, passaram a me seguir. Então, eu resolvi transformar meu perfil em @fofurasdamarina. Meu intuito sempre foi proporcionar trocas de conversas, de informações para outras mães e, também, mostrar o dia a dia de Marina, mostrando que não existe diferença; nada de absurdo; nada de extraordinário comparada às outras crianças. Meu objetivo era quebrar esses preconceitos que, infelizmente, ainda existem”, disse ela.
Nota-se que as redes sociais são ferramentas fundamentais na propagação de informações que ajudam milhares de usuários. O perfil de Marina também cumpre esse papel: “Eu sempre fico muito feliz quando uma mãe chega para mim e diz: [olha, eu fiz aquilo com meu filho, deu super certo. Eu apliquei aquela atividade que você fez com Marina, meu filho está aprendendo.] Fico sem acreditar que consigo contribuir dessa forma. Junto com o desenvolvimento dela, outras crianças também estão aprendendo. Fico muito feliz em saber que acabo inspirando muitas outras pessoas”, destacou a mãe.
Os seguidores ultrapassam as divisas estaduais: “Marininha!!!! Eu amo te acompanhar. Muitos aprendizados já tive aqui conferindo seu dia a dia. Obrigado, a mamãe @brunaaslva, por compartilhar um pouquinho da sua rotina de fofura e evolução diariamente. Quem aqui nunca cantou o bom dia marininha?”, comentou Taelyson, de Caicó, localizado no Rio Grande do Norte.
Comentários como este: “É um dos meus ig preferidos. Alegra meu dia ver a evolução diária dessa neném inteligente e fofa. Obrigada por compartilhar o dia a dia de vocês e nos ensinar tanto” é visto com frequência em diversas publicações no perfil de Marininha (como é conhecida e carinhosamente chamada pela família e amigos).
Além de Marina, Bruna está esperando mais uma menininha. Ela revela qual o seu maior desejo: “Meu maior sonho é viver muito para ver o desenvolvimento pessoal, profissional e a independência das minhas filhas – que agora são duas – uma está aqui no forninho. Estou lutando por isso, quero vê-las independentes, felizes e saudáveis. Se eu viver para ver isso, serei a mulher mais feliz do mundo”, finaliza.
A importância dos estímulos
Nenhuma criança é diferente quando o assunto é atenção e cuidado. Umas mais, outras menos, mas todas necessitam de estímulos. Para a psicopedagoga e especialista em Desenvolvimento Infantil, Geórgia Feitosa, os diagnosticados com Trissomia 21 podem e devem ser estimuladas em todas as áreas possíveis: “Afetivamente, alimentação, estudo, profissão, atividades laborais e de lazer. O que elas não podem é ficar paradas no tempo. Eles são sujeitos de direito e de potencialidades como qualquer outra criança”, frisa a psicopedagoga.
Além disso, ela diz que é fundamental ter os estímulos oferecidos por uma equipe multidisciplinar: “Formada por pediatras, psicopedagogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e psicólogos”, explica Geórgia. A especialista ressalta ainda a importância do acompanhamento familiar: “A família é uma base indispensável nesse processo de quebra de barreiras, de quebra de preconceito. Trabalhar o empoderamento das pessoas acometidas pela Síndrome de Down desde a infância certamente irá resultar na formação de adultos mais autoconfiantes”, detalha.
Projeto Circo Social
Visando reforçar a inclusão, o Grupo Ser Educacional, em parceria com o Instituto Brincantes de Circo, promove oficinas circenses, através do Projeto Circo Social, que tem como objetivo realizar oficinas arte-educativas para pessoas com Síndrome de Down e deficiência intelectual, a fim de proporcionar o acesso à arte e cultura como instrumentos de cidadania e inclusão social. Devido à pandemia do novo coronavírus, as atividades estão acontecendo de forma remota, por meio de lives. Em 2020, as transmissões contaram com oficinas de confecção de equipamentos circenses e técnicas de malabares.
Fernando Henrique, de 29 anos, é um dos alunos do programa. Ele conta que seu sonho é ser palhaço: “Eu gosto de fazer malabares, fazer cambalhotas e fazer muitas brincadeiras, porque é muito bom. O circo era para ser minha casa, é o meu local de trabalho. Eu sou o artista” declara. Sua mãe, Maria Regina, afirma que o projeto trouxe muita diferença na vida deles: “Eles fazem exercícios, saem duas vezes na semana, interage e se diverte com os amigos. É muito bom o Circo Social, porque eles se integram na sociedade”, pontua.
O diretor de Responsabilidade Social da UNINASSAU, Sérgio Murilo, comenta a importância da iniciativa: “O projeto já está consolidado nas nossas ações de responsabilidade social e ficamos sempre ansiosos para o início de novas turmas. Sempre buscamos uma transformação social e o Circo Social é um agente transformador na vida destes jovens”, concluiu.