Opinião do Convidado: Diante da ameaça dos EUA de impor mais tarifas, o Brasil diz não

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Opinião do Convidado: Diante da ameaça dos EUA de impor mais tarifas, o Brasil diz não

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursa durante uma entrevista conjunta com a mídia chinesa em Brasília, Brasil, em 5 de maio de 2025. (Xinhua/Wang Tiancong)

Por Evandro Menezes de Carvalho

A decisão de Donald Trump de impor tarifas adicionais de 50% sobre todas as exportações brasileiras para os Estados Unidos, a partir de 1º de agosto, foi um choque para o público brasileiro devido à maneira e às motivações descritas pelo próprio presidente dos EUA.

Trump deu vários sinais de que protocolos diplomáticos são perda de tempo. Ele acredita piamente na persuasão pela força. O presidente americano não tem a paciência de um diplomata versado na arte da negociação entre países soberanos, mesmo que seja apenas para manter as aparências. Trump parece ser um daqueles que não têm paciência para esperar um convidado estrangeiro para o seu jantar, para o receber, para o acomodar à mesa e para aguardar que os pratos sejam servidos, brindando, de antemão, à presença do seu ilustre convidado. Muitos floreios. Mas nas relações internacionais que se pretendem pacíficas e duradouras, mesmo que o assunto do jantar seja relativamente indigesto, o convidado deve ser tratado com o devido respeito e com a esperança de que regresse a casa minimamente satisfeito. Ou, pelo menos, que não se despeça como um novo inimigo.

O método de negociação de Trump é hostil e desrespeitoso. Além disso, a medida que ele anunciou contra o Brasil não tem justificativa do ponto de vista da balança comercial. No ano passado, os Estados Unidos tiveram um superávit de US$ 2 bilhões. Atualmente, o déficit comercial do Brasil com os Estados Unidos já ultrapassa US$ 3 bilhões. Some-se a isso o fato de que as próprias estatísticas do governo dos Estados Unidos, como disse Lula, “comprovam um superávit daquele país no comércio de bens e serviços com o Brasil de aproximadamente US$ 410 bilhões nos últimos 15 anos”. Diante disso, a afirmação de Trump de que a relação dos EUA com o Brasil “tem estado longe de ser recíproca” soa mais como uma provocação do que como uma afirmação crível.

Por que, então, aumentar as tarifas sobre produtos brasileiros de forma uniforme e sem critério? Porque a medida de Trump não tem nada a ver com comércio bilateral. Tem a ver, antes de tudo, com as decisões e investigações do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o financiamento de atos antidemocráticos, ataques ao sistema eleitoral e campanhas de desinformação patrocinadas pela extrema direita.

O Supremo Tribunal Federal (STF) exigiu que plataformas como o X (antigo Twitter), YouTube, Meta e Telegram cumpram ordens judiciais para remover conteúdo ilegal, identificar usuários que promovam golpes ou violem a Constituição Federal brasileira e bloquear perfis que sejam reincidentes em desinformação. Isso irrita as grandes empresas de tecnologia, que preferem operar com pouca ou nenhuma regulamentação em países em desenvolvimento, onde frequentemente resistem ao cumprimento de decisões judiciais locais. E também irrita Trump. Em última análise, todo o movimento de extrema direita ao redor do mundo depende de mídias sociais não regulamentadas para disseminar seu projeto de poder, fazendo uso extensivo de notícias falsas.

Captura de tela de uma carta do presidente dos EUA, Donald Trump, ao presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, 10 de julho de 2025.

Para Trump e a extrema direita global, o que está acontecendo no Brasil serve como um espelho ou laboratório. O fato de o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro estar sendo investigado, condenado e inelegível com base em decisões judiciais — especialmente por atacar o sistema eleitoral — acende um sinal de alerta simbólico para Trump e seus aliados. Algo como “se isso aconteceu com o Bolsonaro, pode acontecer com você também”. Portanto, atacar o Supremo Tribunal Federal é, para a extrema direita, uma forma de reforçar a narrativa de que existe uma suposta “conspiração judicial global” contra a nova direita populista.

Por fim, a segunda justificativa de Trump para impor um imposto de 50% sobre as exportações brasileiras é que Lula, além de defender a regulamentação das gigantes da tecnologia, juntou-se ao coro de líderes internacionais que defendem a redução da dependência do dólar. Lula fez essas declarações durante a 17ª Cúpula dos BRICS, que atualmente ostenta um PIB em paridade de poder de compra já superior ao dos países do G7. Tal agenda de política externa, se perseguida pelos países do BRICS, é considerada uma ameaça vital à hegemonia global dos EUA.

Trump lançou a guerra comercial contra o Brasil. Mas suspeito que, com a medida anunciada, o presidente americano queira, mais do que punir o Brasil, testar Lula e determinar que tipo de liderança política ele exercerá no Brasil. Ou seja, se Lula será tolerante com os Estados Unidos (como Jair Bolsonaro já foi), ou se será um líder que impõe respeito e serve exclusivamente ao povo brasileiro.

Captura de tela da resposta do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva ao presidente dos EUA, Donald Trump.

No caso de Lula, a segunda opção é a resposta correta. Não há dúvida. Trump já deveria saber disso. Mas o que ele pode esperar ao perguntar ao presidente liberiano Joseph Boakai onde ele aprendeu a falar tão bem, sem ser informado de que essa era a língua oficial do país de seu ilustre convidado? 

Evandro Menezes de Carvalho é professor de Direito Internacional da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Brasil.

(As opiniões expressas neste artigo são do autor e não refletem necessariamente as opiniões da Agência de Notícias Xinhua.)

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