Beijing – Reino Unido, Canadá, Austrália e Portugal reconheceram formalmente, neste domingo, o Estado Palestino para pressionar por uma “solução de dois Estados”, enquanto Israel segue com sua ofensiva e anexação em Gaza, apesar da crescente condenação internacional.
Com a expectativa de que a França siga o exemplo na próxima Assembleia Geral da ONU, a medida provocou uma reação furiosa de Israel. Também marcou uma ruptura brusca com os Estados Unidos, que haviam se oposto a esse reconhecimento.
LINHA DE RECONHECIMENTO AMPLIADA
Em uma declaração em vídeo na rede social X, o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, anunciou que o país “reconhece formalmente o Estado Palestino” para “reavivar a esperança de paz e uma solução de dois Estados”.
“A crise humanitária provocada pelo homem em Gaza atinge novos patamares”, disse Starmer. “O bombardeio implacável e crescente do governo israelense contra Gaza, a ofensiva das últimas semanas, a fome e a devastação são intoleráveis”.
“Estas mortes e destruição horrorizam a todos nós. Isso precisa acabar”, observou ele.
Reconhecendo que a esperança por uma solução de dois Estados estava se esvaindo, Starmer insistiu que “não devemos deixar essa luz se apagar”.
Fumaça na Cidade de Gaza após ataque aéreo israelense em 12 de setembro de 2025. (Foto por Rizek Abdeljawad/Xinhua)
O anúncio britânico ocorreu uma hora depois de o Canadá reconhecer formalmente o Estado Palestino.
No início do domingo, o primeiro-ministro canadense, Mark Carney, emitiu um comunicado, dizendo: “O Canadá reconhece o Estado Palestino e oferece nossa parceria na construção da promessa de um futuro pacífico para o Estado Palestino e para o Estado de Israel”.
“O atual governo israelense está trabalhando metodicamente para impedir que a perspectiva de um Estado Palestino seja estabelecida”, disse Carney. “Ele tem seguido uma política implacável de expansão de assentamentos na Cisjordânia, o que é ilegal segundo o direito internacional”.
Austrália e Portugal também se juntaram ao Canadá.
Enquanto a Austrália disse que o reconhecimento da Palestina faz parte de um “esforço internacional coordenado para construir um novo impulso para a solução de dois Estados”, Portugal afirmou que essa solução “é o único caminho para a paz”.
Em resposta, o presidente palestino, Mahmoud Abbas, disse que o reconhecimento ajudaria a pavimentar o caminho para que o “Estado Palestino conviva lado a lado com o Estado de Israel em segurança, paz e boa vizinhança”.
Enquanto isso, o Hamas também elogiou a medida. Basem Naim, um membro sênior do gabinete político do Hamas, disse ao canal de notícias americano CNN no domingo que “qualquer medida para fortalecer os direitos legítimos dos palestinos, principalmente o Estado Palestino totalmente soberano com capital em Jerusalém e o direito à autodeterminação, é uma medida bem-vinda”.
“ISSO NÃO ACONTECERÁ”
Israel criticou duramente o reconhecimento sucessivo da Palestina por seus aliados.
“Tenho uma mensagem clara para os líderes que reconhecem um Estado Palestino”, disse o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu: “Isso não acontecerá. Um Estado Palestino não será estabelecido a oeste do Rio Jordão”.
Na reunião semanal do governo no domingo, Netanyahu disse que o apoio à criação de um Estado Palestino “colocará em risco nossa existência e constituirá um prêmio absurdo para o terrorismo”. Ele acrescentou que Israel lutará nas Nações Unidas e em outras organizações internacionais “contra a propaganda caluniosa dirigida contra nós”.
Sobre a anexação da Cisjordânia, Netanyahu disse que Israel dobrou os assentamentos judaicos no enclave e “continuará neste caminho”.
Membros das forças israelenses são vistos em operação militar em Ramala, na Cisjordânia central, em 16 de setembro de 2025. (Foto por Ayman Nobani/Xinhua)
Previsto para discursar na Assembleia Geral da ONU na sexta-feira antes de visitar o presidente dos EUA, Donald Trump, na Casa Branca, Netanyahu disse que anunciaria a resposta de Israel “à mais recente tentativa de nos impor um estado terrorista no coração de nossa terra” após a viagem.
A CNN disse em uma reportagem de domingo que Netanyahu tem poucas opções sobre como Israel responderia sem o apoio de Trump.
“Mas com esse apoio, que Netanyahu está claramente sinalizando ter, o líder israelense sente que pode fazer praticamente qualquer coisa, sob a proteção diplomática dos EUA”, afirmou.
Enquanto isso, o ministro das Finanças de extrema-direita do país, Bezalel Smotrich, disse no domingo que a “única resposta” é a anexação de toda a Cisjordânia e “remover a péssima ideia de um Estado Palestino da agenda de uma vez por todas”.
No início deste mês, Smotrich revelou um mapa destacando sua visão de anexar 82% da Cisjordânia.
Em agosto, Smotrich provocou indignação internacional ao afirmar que seria “justificado e moral” matar 2 milhões de pessoas em Gaza para libertar os reféns, levando a UE a solicitar ao governo israelense que “se distanciasse inequivocamente” das declarações de Smotrich.
EUA CADA VEZ MAIS ISOLADOS
Dois anos após o início do conflito, o governo Trump se encontra cada vez mais isolado em relação à questão de Gaza.
Enquanto mais países denunciam a agressão israelense em Gaza, os Estados Unidos se mantêm firmes ao lado de seu aliado, fornecendo cobertura política e apoio militar.
Trump ainda não respondeu aos acontecimentos de domingo, mas expressou sua desaprovação ao reconhecimento da condição de Estado Palestino durante uma visita ao Reino Unido na semana passada.
Em uma coletiva de imprensa com Starmer na quinta-feira, Trump disse que discorda de Starmer “nesse aspecto, uma de nossas poucas divergências, na verdade”.
O governo Trump vem repreendendo seus aliados por apoiarem a Palestina desde que declararam, em julho, que reconheceriam sua condição de Estado caso um cessar-fogo não fosse alcançado.
“O presidente expressou seu descontentamento e sua discordância com os líderes da França, do Reino Unido e do Canadá”, disse a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, a repórteres na época. “Ele sente que isso está recompensando o Hamas em um momento em que o Hamas é o verdadeiro impedimento para um cessar-fogo e para a libertação de todos os reféns”.
Trump chegou a alertar Carney que o reconhecimento da Palestina como um Estado pelo Canadá “dificultará muito” futuras negociações comerciais entre os dois vizinhos.
Na quinta-feira, Washington vetou novamente um projeto de resolução no Conselho de Segurança da ONU, bloqueando um apelo por um cessar-fogo imediato e permanente em Gaza, juntamente com a libertação de reféns e o levantamento de todas as restrições ao acesso e entrega de ajuda humanitária no enclave.
Com todos os outros 14 membros do conselho votando a favor, o representante dos EUA alegou que o projeto “não condena o Hamas nem reconhece o direito de Israel de se defender”.
Fu Cong, representante permanente da China nas Nações Unidas, disse que a China está profundamente decepcionada com o resultado da votação.
Ele observou que o conflito em Gaza se arrasta há quase dois anos, criando um desastre humanitário sem precedentes. Apesar dos repetidos esforços do Conselho de Segurança para tomar medidas, cada tentativa foi bloqueada pelos Estados Unidos.
Concordando com as declarações de Fu, a embaixadora britânica na ONU, Barbara Woodward, lamentou que o Conselho de Segurança não tenha chegado a um consenso sobre o projeto de resolução.
“Precisamos de um cessar-fogo mais do que nunca. E, no entanto, a expansão imprudente de Israel em sua operação militar nos afasta ainda mais de um acordo que poderia trazer os reféns de volta e acabar com o sofrimento em Gaza”, disse ela.
“Estamos vendo uma fome totalmente provocada pelo homem em Gaza e imagens de palestinos famintos sendo mortos, enquanto buscavam desesperadamente por restos de comida para suas famílias”, disse ela. “Instamos o governo de Israel a acabar com o derramamento de sangue, que já custou a vida de 65.000 palestinos, e a suspender imediatamente suas restrições à entrada de ajuda humanitária, permitindo que a ONU e as agências humanitárias salvem vidas”.